Mais que letras: piauienses da comunidade LGBTQIAPN+ falam de significado de cada letra, identidade e pertencimento (2024)

Nesta sexta-feira (28) é celebrado o Dia Internacional do Orgulho LGBTQIAPN+ e para explicar cada letra dessa sigla o g1 ouviu membros da comunidade que são representados por uma ou mais dessas letras.

O mês do orgulho é celebrado em junho porque foi neste mês do ano de 1969 que a polícia invadiu um bar frequentado por membros da comunidade, em Nova York, chamado Stonewall. O episódio deu origem a uma série de protestos e, em junho do ano seguinte, surgiu a primeira grande parada LGBT+, conhecida como "Libertation Day".

Antes de seguir com os depoimentos, é necessário entender que dentro da sigla existem algumas categorias. A comunidade se divide em dois grandes grupos: identidade de gênero e orientação sexual.

  • Identidade de gênero diz respeito à experiência interna e individual relacionada ao gênero com o qual a pessoa se identifica. Não está necessariamente relacionada com características biológicas tipicamente atribuídas aos sexos masculino e feminino. Há pessoas que se identificam com um gênero diferente daquele do seu nascimento. Quando a identidade de gênero de uma pessoa corresponde ao seu sexo biológico, dizemos que essa pessoa é cisgênera. Quando, por outro lado, a pessoa se identifica com um gênero diverso daquele que lhe foi designado ao nascer, trata-se de pessoa transgênera ou, simplesmente, trans.
  • Orientação sexual diz respeito à atração que se sente por outros indivíduos. Ela geralmente também envolve questões sentimentais, e não somente sexuais.

Letra L

A letra L representa as mulheres lésbicas: pessoas que se identificam com o gênero feminino e se relacionam com outras do mesmo gênero.

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Oito em cada dez mulheres lésbicas já sofreram algum tipo de violência e 70% delas têm medo de dizer a orientação sexual nos atendimentos de saúde. É o que aponta o primeiro censo voltado para a população lésbica brasileira, realizado em 2023 pela Liga Brasileira de Lésbicas e Mulheres Bissexuais (LBL), em parceria com a associação lesbofeminista Coturno de Vênus.

A letra L representa as mulheres lésbicas: pessoas que se identificam com o gênero feminino e se relacionam com outras do mesmo gênero. — Foto: Reprodução

Letra G

A letra G representa os homens gays: pessoas que se identificam com o gênero masculino e se relacionam com outros homens.

"É importante também entender que ser gay é uma parte natural da diversidade humana e que a orientação sexual de uma pessoa é uma característica inata, assim como a cor dos olhos ou a altura. Todos os dias nós somos atravessado por questões sociais, culturais, familiares e religiosa, fazendo que sejamos condicionados a nos moldar ao meio. Mas em suma, é desafiador ser gay no Piauí", contou Gustavo.

Gustavo Sousa é estudante universitário e para ele o dia 28 de junho representa uma data de celebração, mas também de memória. Então, além de se orgulhar, é também um dia de luta por você mesmo e pela existências dos demais.

Gustavo Sousa é um homem gay, estudante universitário, e essa é a sua bandeira. — Foto: Reprodução

Letra B

A letra B representa as pessoas bissexuais: que se atraem por outras pessoas com o mesmo gênero que o seu ou não. Além disso, essa orientação sexual também se atrai por pessoas agêneros ou trans.

Existe o pré-conceito de que membros dessa letra se relacionam somente com homem ou mulher, mas segundo o Manifesto Bissexual, elaborado em 1990 pela comunidade bi:

Bissexualidade é um todo, identidade fluída. Não assuma que a bissexualidade é naturalmente binária ou poligâmica: que nós temos “dois” lados ou que nós precisamos estar envolvidos simultaneamente com dois gêneros para sermos seres humanos completos. De fato, não assuma que existem apenas dois gêneros

— O manifesto foi publicado originalmente em 1990, pela revista “Anything That Moves”

Para a jornalista Amanda Bonfim ser bissexual no Piauí é um desafio, no entanto também há momentos de coragem e aceitação.

"Ser bissexual é ter a capacidade de sentir atração e se permitir amar mais de um gênero, ao contrário do que muitos pensam, não nos limitamos a homens e mulheres cis. Além disso, ser bi não se trata de uma fase ou de indecisão; é simplesmente uma parte de quem somos. Ser bi é sentir o coração bater mais forte por alguém, independentemente do gênero dessa pessoa. É encontrar beleza e conexão em mais de uma forma de amar", explicou.

Para a jornalista Amanda Bonfim ser bissexual no Piauí é um desafio, no entanto também há momentos de coragem e aceitação. Essa é a sua bandeira. — Foto: Reprodução

"O Dia do Orgulho representa, para mim, um momento de celebração e de luta. É um dia para lembrar que não estamos sozinhos, que fazemos parte de uma comunidade vibrante e resiliente. É uma data para levantar nossas vozes contra a discriminação e para afirmar que nosso amor é válido. Celebrar o orgulho é um ato de resistência, de dizer que existimos e que merecemos ser tratados com dignidade e respeito. É um lembrete de que, apesar das dificuldades, nosso amor brilha intensamente", frisou a jornalista.

Letra T

Transexuais e travestis são representados pela letra T que diz respeito às pessoas que não se identificam com o gênero atribuído no nascimento.

“Somos quem somos, não por escolha, mas por já existir em nós a verdade da nossa identidade. Nossa história não começou aqui. Toda pessoa trans vive uma na outra. Eu sou porque nós somos. Não nos reduzimos à nossa identidade. Somos filhas e filhos, netas e netos, mães e pais. Nossos transcestrais, pessoas trans que vieram antes de nós, nos ensinam por meio do seu legado. Ocupamos todos os lugares, independente das más condições ofertadas. Tenho orgulho da história de resistência das pessoas transvestigênere em todo o Piauí”, declarou a estudante universitária Vitória Luna.

Transexuais e travestis são representados pela letra T, a estudante universitária Vitoria Luna é travesti. Essa é a sua bandeira. — Foto: Reprodução

Letra Q

A letra Q, de Queer, representa pessoas que não se identificam com os padrões impostos pela heterocisnormatividade. Um termo guarda-chuva para pessoas que não se enquadram nas condições tradicionais de gênero e/ou sexualidade.

Para a confeiteira Iara Jardilina misturar peças de roupa do guarda-roupa masculino e feminino é algo comum.

"As normas pressupostas para cada gênero não fazem sentido para mim. Ser uma pessoa Lgbtq+ no Piauí é difícil como em qualquer lugar no Brasil, mas morando numa cidade de interior e tento os privilégios da bolha que vivo, me sinto mais segura que morando numa grande capital, como São Paulo, onde já morei e sentia medo a cada vez que saía", explicou.

Segundo ela, o dia do orgulho representa o momento de lembrar e celebrar as conquistas da comunidade e relembrar que foi preciso sacrifício e sofrimento de pessoas corajosas pra garantia de direitos conquistados.

Letra I

A letra I identifica as pessoas intersexo, ou seja, pessoas que possuem características biológicas dos sexos feminino e masculino ao mesmo tempo. Este grupo nasceu com características sexuais (como cromossomos, genitália e/ou órgãos reprodutivos) que não se encaixam nas definições típicas de masculino ou feminino.

Uma pesquisa da Organização das Nações Unidas (ONU) estimou que entre 0,05% e 1,7% da população mundial nasce com características intersexo — o que pode significar até 3,5 milhões de pessoas apenas no Brasil.

Essas pessoas podem ter alterações hormonais, genitais ambíguos e outras diferenças anatômicas, ou ainda nascer com códigos genéticos diferentes do padrão. Um exemplo: o corpo pode ser fisicamente feminino, mas o seu código genético ser XY (X é o cromossomo feminino e Y é o masculino), o que pode afetar o desenvolvimento e a produção de hormônios.

O pesquisador em gênero e psicólogo Trix Gomes, que não é uma pessoas intersexo, mas explicou por que esses membros da comunidade são tão pouco conhecidos.

"A intersexualidade, ela rompe com esse binarismo biológico. Uma das grandes lutas do movimento intersexo é justamente contra a mutilação de bebês intersexos. É muito comum médicos e pais também, e mães, por não saberem muito sobre a intersexualidade, acabem acatando por cirurgias que acabam mutilando, em que você escolhe realmente qual é o sexo do seu bebê", afirmou.

Mais que letras: piauienses da comunidade LGBTQIAPN+ falam de significado de cada letra, identidade e pertencimento (1)

Orgulho de ser quem se é: o direito à cidadania de pessoas intersexo

Antigamente, pessoas intersexo eram chamadas de hermafroditas, mas o termo caiu em desuso. Além de ser pejorativo, é associado apenas aos genitais ambíguos ou pessoas que nasciam com os dois genitais, masculino e feminino.

Letra A

O A da sigla representa os assexuais. São pessoas, em linhas gerais, que não sentem atração sexual ou necessidade de ter relações sexuais. Mas esta é uma definição simplificada do grupo que se define como assexual. A assexualidade é uma orientação sexual e o termo pode ser usado como um guarda-chuva dentro do espectro de pessoas assexuais (assexual estrito, demissexuais, gray-a, entre outras).

A psicóloga Amanda Ravenna disse ao g1 como ela se identifica e se enxerga dentro da comunidade LGBTQIAPN+.

"Eu sou assexual estrita e foi muito difícil a minha aceitação, principalmente por morar em uma cidade pequena no Piauí você não vê possibilidade de existir sendo ace, não existe visibilidade e muito menos compreensão quando explico. O dia do orgulho pra mim me lembra que não estou sozinha, eu sei que ainda existem pessoas da própria comunidade que não validam a letra A e que temos um longo caminho pela frente, espero que nós possamos continuar lutando do mesmo lado e conseguir nossos direitos", declarou.

A psicóloga Amanda Ravenna se identifica e se enxerga dentro da comunidade LGBTQIAPN+ como uma pessoa assexual. Essa é a sua bandeira. — Foto: Reprodução

Essa orientação, segundo especialistas, não está ligada com falta de libido, questões biológicas ou de ordem psicológica, como traumas, diferente do que algumas pessoas pensam.

Letra P

As pessoas representadas pela letra P são as pansexuais, que se relacionam com outras independente do gênero ou não-gênero.

Reduzir a importância do papel de gênero na atração e nos relacionamentos é o papel central da pansexualidade.

De forma geral, o termo 'pansexual' — representado pelas cores do bottom da imagem — atende ao propósito de retirar a importância de gênero da equação de atração — Foto: Getty Images via BBC

Letra N

A letra N, de não-binário, representa pessoas trans que não se identificam com o gênero feminino ou masculino, podendo se identificar com mais de um ou nenhum destes.

Trix Gomes é não-binário, piauiense, psicólogo e explica como a sua identidade se manifesta para ele.

"É importante destacar que a não-binariedade não é uma confusão das duas coisas, masculino e feminino; não é uma fase. A não-binariedade é uma identidade de gênero válida. Minha identidade foge desse modelo binário e colonial que a gente tem de gênero. A não-binariedade vem para dizer que existem pessoas que estão para além do masculino e do feminino, que estão para além do homem. E do que se entende enquanto mulher, e que essas pessoas são válidas e existem", destacou.

Trix Gomes é não-binário, piauiense, psicólogo e explica como a sua identidade se manifesta para ele. Essa é a sua bandeira. — Foto: Reprodução

A psiquiatra Alessandra Diehl frisa que as pessoas não-binárias precisam ser vistas com base nos estudos feitos sobre o tema, não em "achismos" ou crenças. "Pode ser bastante complicado dialogar se as pessoas entenderem que o mundo é apenas das meninas que vestem rosa ou dos meninos que vestem azul".

Sigla +

A inclusão do "+" é uma forma de reconhecer todas as outras identidades e orientações que não estão explicitamente representadas nas letras anteriores, como por exemplo as "Mães da Resistência", criado no Piauí, que é um grupo de mães de pessoas trans que se uniram à causa LGBT+ de luta e orgulho.

Amanda Pitta, mãe de uma adolescente trans, faz parte dessa categoria na comunidade LGBT.

"A transição dela foi ainda com 4 anos de idade, quer dizer, eu já tenho 10 anos nessa luta. No começo foi bem difícil, não a maternidade, mas todas as lutas que envolvem o entorno pra garantia dos direitos e do conforto dela. Hoje em dia ela já tem o ciclo de amizade com outros adolescentes trans. Já é um assunto mais falado", declarou Amanda.

"O Dia da Visibilidade e o Dia do Orgulho, são muito importantes justamente por trazer essa visibilidade e essa discussão, eu sou uma mãe cis de uma adolescente trans e de uma mulher bissexual. Então essas datas têm essa importância pra trazer essa visibilidade", completou a mãe orgulhosa.

Amanda Pitta, mãe de uma adolescente trans, faz parte dessa categoria na comunidade LGBT. — Foto: Reprodução

O arquiteto Jefferson Veras se identifica com o + da sigla. Ele contou ao g1 que prefere não se encaixar em nenhuma letra. Atualmente, tem um relacionamento hom*oafetivo, mas não se representa como gay.

"Com o passar dos anos, percebo um movimento cada vez mais de não segregação, tipo, num mundo utópico, se não existe siglas, seriamos só pessoas e não precisaríamos deduzir, adivinhar ou supor sexualidade e gênero de ninguém, até porque isso não deveria ser da conta de ninguém, somente de nós mesmo", afirmou.

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